Mão
Morta

mão morta ao vivo na aula magna

Ao vivo na Aula Magna

Gin Tonic

Carlos Corais / Miguel Pedro

Hello Tonic!
Que bom Gin!...
Gin, Gin…
Um pé alto cheio de mim.

Um gesto de arauto,
A lua cheia,
Ou não, enfim…

A teia a crescer, crescer
Um bandolim a solar
Uma qualquer
Sereia a tilintar.

Tlim, tlim, tlim…

Acordo enrolado
Num pudim
Em taça de cristal,
Tlim!...

Nada a Perder

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Há uma enorme festa nas ruas
De vez em quando aparece a polícia e tenta prender
Matar toda a gente
Sobretudo quando nos aventuramos pelos bairros residenciais
Onde pessoas aterrorizadas fingem que tudo vai bem
Encarceradas frente à televisão
Quando partimos uma montra ou saqueamos uma loja
Quando atacamos colunas de assalariados
O truque é ter um bom veículo para a fuga
Recolher rapidamente ao nosso território Às ruínas
E partilhar os despojos
Há sempre uma garrafa para beber
E uma mulher para amar
Quando nada se tem a perder

Primavera de Destroços

Zé dos Eclipses / Zé dos Eclipses

Caio nesses olhos apáticos
Caio nesse hipnótico abraço
Desta viagem entre flores plásticas
E coloridas manhãs de aço
Viveremos tudo revoltosos
Nesta Primavera de destroços
Sem dor, sem rancor, sem remorsos
Nesta Primavera de destroços

É um jogo

Adolfo Luxúria Canibal / António Rafael

É um jogo a que não podemos jogar
Um jogo de que somos os espectadores
Um jogo de desconhecidos jogadores
Um jogo a que nunca iremos ganhar

Olha a menina a dançar tão bela no seu saltitar
Canta a roleta a rodar mistérios da sorte e do azar
Olha a menina a dançar quem vai com ela ficar?
Canta a roleta a rodar mistérios da sorte e do azar

É um jogo feito para nos comandar
Um jogo de que desconhecemos as regras
Xadrez de que se retiraram as negras
Um jogo feito para nunca acabar

Olha a menina a dançar tão bela no seu saltitar
Canta a roleta a rodar mistérios da sorte e do azar
Olha a menina a dançar quem vai com ela ficar?
Canta a roleta a rodar mistérios da sorte e do azar

É a nossa a vida que está em jogo

É a nossa a vida que outros jogam

Tu Disseste

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Tu disseste “quero saborear o infinito”
Eu disse “a frescura das maçãs matinais revela-nos segredos insondáveis”
Tu disseste “sentir a aragem que balança os dependurados”
Eu disse “é o medo o que nos vem acariciar”
Tu disseste “eu também já tive medo. muito medo. recusava-me a abrir a janela, a transpor o limiar da porta”
Eu disse “acabamos a gostar do medo, do arrepio que nos suspende a fala”
Tu disseste “um dia fiquei sem nada. um mundo inteiro por descobrir”
Eu disse “...”
Eu disse “o que é que isso interessa?”
Tu disseste “...nada”
Tu disseste “agora procuro o desígnio da vida. às vezes penso encontrá-lo num bater de asas, num murmúrio trazido pelo vento, no piscar de um néon. escrevo páginas e páginas a tentar formalizá-lo. depois queimo tudo e prossigo a minha busca” Eu disse “eu não faço nada. fico horas a olhar para uma mancha na parede”
Tu disseste “e nunca sentiste a mancha a alastrar, as suas formas num palpitar quase imperceptível?”
Eu disse “não. a mancha continua no mesmo sítio, eu continuo a olhar para ela e não se passa nada”
Tu disseste “e no entanto a mancha alastra e toma conta de ti. liberta-te do corpo. tu é que não vês”
Eu disse “o que é que isso interessa?”
Tu disseste “...nada”

Arrastando o Seu Cadáver

Adolfo Luxúria Canibal / António Rafael

É demencial Não há palavras que consigam dizer o horror
Vi um pobre homem agarrado ao que restava da sua mulher
Errando pela baixa
Os olhos fixos num horizonte perdido
Sem uma palavra Sem um som
Arrastando a carcaça desfigurada
Por entre o trânsito do fim da tarde
Passei sem conseguir dizer nada
Ninguém dizia nada O silêncio
Acompanhava o olhar vazio A dor
A vaguear por entre as ruínas e o trânsito do fim da tarde
As pessoas apressavam-se por causa do cair da noite
E o pobre homem seguia um destino sem rumo
Arrastando o seu cadáver
E o pobre homem seguia um destino sem rumo
Arrastando o seu cadáver
Ninguém dizia nada O silêncio
Acompanhava o olhar vazio A dor

Penso que Penso

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Caminho em silêncio
Distraído por um pensar
Que me turba o andar
Penso que penso
E fico a ouvir-me a pensar
Que penso que penso
Este pensamento
Torna-se um tormento
Penso que penso
Que penso que penso
Sempre o mesmo a dobrar
Como vozes a segredar
Penso que penso
Que penso que penso
Que ainda vou flipar
Flipar

ESTOU FARTO DE MIM!

Já não posso mais andar
Com tanta voz a murmurar
Levado pelo vento
Penso que penso
Que penso que penso
Que penso que penso
E se penso em parar É mais um pensamento
Que me fica a ecoar
Outra voz a segredar
Outra voz a murmurar
Murmurar
Murmurar… murmurar… murmurar…

ESTOU FARTO DE MIM!

Em Directo (para A Teelvisão)

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Avanço lesto
Por entre a multidão
Insana presa
De ecrãs de teelvisão
Alarmes soam
Em todo o quarteirão
Disparos gritos
Lançando a confusão

É guerra sem quartel
De empresas rivais
Na busca do controle
De mercados locais
Ou então... Ou então...
Encena-se um directo
Para a teelvisão

Sirenes passam
Em grande aceleração
Olhando para
Ecrãs de teelvisão
O caso surge
Com outra dimensão
Imagens com voz
Servindo de guião

É guerra sem quartel
De empresas rivais
Na busca do controle
De mercados locais
Ou então... Ou então...
Encena-se um directo
Para a teelvisão

Amesterdão (Have big fun)

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Amsterdam!
Have big fun!
Have big fun!

Entrei no Amstel a toda a velocidade e quase abalroei um barco-táxi que ia a passar. O piloto ficou a mandar vir de punho erguido mas eu continuei no máximo de aceleração Amstel abaixo. Adoro sentir o vento frio na cara! Junto ao Munt Plein acostei e fui dar uma olhada ao catálogo do Big Fun. Tinham Black Bombay. Comprei dois pacotes e enrolei um joint a acompanhar o café. Depois meti-me no barco e rumei à Red Light – apetecia-me sexo ao vivo! Pelas ruas que ladeiam o canal a multidão, vagarosa, espreitava as raparigas nas montras. Acostei frente ao Jimmy's ouvindo o jazz melancólico que vinha da cave e entrei no Barbie. Estava quase vazio. No palco- aquário um casal iniciava um número de sexo: o homem, de mãos atadas, tinha uma corda à volta do pescoço que a mulher ia apertando com o crescendo da excitação – morreu enforcado no momento do orgasmo! Gostei da representação. Enrolei outro joint e saí. Cá fora a multidão continuava a sua passeata mironante e quase fui atropelado por um ciclista. Meti-me no barco e regressei a casa. A toda a velocidade.

Have big fun!
Have big fun!
Have big fun!

Cão da Morte

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

No calor da febre que me alaga toda a fronte
Sinto o gume frio da navalha até ao osso
Sinto o cão da morte a bafejar no meu pescoço
E a luz do sol a fraquejar no horizonte.
Já desfila trémulo o cortejo do passado
Que me deixa quedo, surdo e mudo de pesar
Vejo o meu desgosto na beleza do teu rosto
Sinto o teu desprezo como um dardo envenenado.

Morro! Morro! No altar de ti.

Sopra forte o vento na fogueira que arde em mim.
Sinto a selva agreste nos batuques do meu peito.
No cruel caminho em que me lança o desespero
Sinto o gelo quente do inferno do meu fim.
No calor da febre que me alaga toda a fronte
Sinto o gume frio da navalha até ao osso
Sinto o cão da morte a bafejar no meu pescoço
E a luz do sol a fraquejar no horizonte.

Morro! Morro! No altar de ti.

Sinto o cão da morte a bafejar no meu pescoço...
Morro! Morro! No altar de ti.

O Jardim

Adolfo Luxúria Canibal / António Rafael

Há tanto tempo que não me ocupo do jardim
A última vez estava frondoso
A buganvília a tingir-se de vermelho Trepando
O perfume inebriante
E as festas ao cair da tarde
Parece que foram há séculos Noutra encarnação
Os meus amigos traziam as bebidas
E a jovialidade
O jardim enchia-se de gente De beijos
Pelos cantos Sôfregos de desejo
Inventávamos planos de rebelião Sonhos de transmutação
Passávamos horas a inventar Entre duas carícias
Surgiam ideias puras e inocentes
Como a nossa vontade de tudo abarcar
Era um frenesim constante
Faz-me pena agora olhar para ele
Para as suas sebes abandonadas De ramos
Retorcidos jaz tombada a grande epícea
E uma enorme cratera
Substitui os belos canteiros de outrora
Há tanto tempo que não me ocupo do jardim

Anarquista Duval

Adolfo Luxúria Canibal / Carlos Fortes, Zé dos Eclipses

Pela estrada fora vinha um homem
Encoberto pelas sombras da noite. Alguém
Lhe perguntou o nome. – Sou uma miragem. Dizem que
Semeio o caos e a destruição como o vento
Semeia as papoilas. Meu nome
É Liberdade.

Vinha pela estrada
Fora a Liberdade encoberta pela noite
Das sombras. – Sabes quem eu sou? – Perguntou
Ao candeeiro. – És uma miragem
E pertences ao livro dos sublinhados provocadores
Que são os poetas. Almas sonhadoras.

– Anarquista Duval, prendo-te em nome da lei!
– E eu suprimo-te em nome da liberdade!

Sublinhados provocadores iam pela estrada
Fora carregando o livro
Das sombras. Da noite
Só restava o candeeiro
Encoberto...

Chabala

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Abriu a primeira porta que viu à mão e entrou
Os seus olhos fotografaram instantaneamente o quarto
Viu-a pelo espelho, imóvel, no limiar da porta
Ela adiantou-se; ele tirou a pistola da algibeira
Estremeceu na noite fria envolta em nevoeiro
Havia vagões e pilhas de carvão por todos os lados
Dentro da casa não havia sinal de vida
Enfiado pela chaminé estava um corpo de mulher

Quem matou a chabala?

ao vivo na aula magna

Ficha técnica

Gravado ao vivo em 8 de Maio de 2001 por Nelson Carvalho na Aula Magna – Lisboa e misturado em Maio e Junho de 2001 por Nelson Carvalho e Miguel Pedro na Casa do Rolão – Braga. Produção de Nelson Carvalho e Miguel Pedro.

CHABALA Gravado em Abril de 2000 por Nelson Carvalho nos Estúdios Kasbah – Porto e misturado em Dezembro de 2000 por Nelson Carvalho nos Estúdios de Paço D’Arcos – Oeiras. Produção de Miguel Pedro.

Capa de Sónia Teixeira Pinto sobre fotografia de Jorge Souto. Editado em Janeiro de 2002. Edição original NorteSul.

  • Adolfo Luxúria Canibal – voz
  • Miguel Pedro – bateria, programações, saxofone
  • António Rafael – guitarra, teclas
  • Vasco Vaz – guitarra
  • Sapo – guitarra, bateria
  • Joana Longobardi – baixo, contrabaixo

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