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Morta

rituais transfigurados

Rituais Transfigurados

Um Estudo Coreográfico para a Câmara

Miguel Pedro

Na Terra

Adolfo Luxúria Canibal / António Rafael

Tchiu!... Tchiu!... Tchiu!... Tchiu!... Tchiu!...
Bzzzbzzzzbzzz… Abaicadoba… Bzzzbzzzzbzzz… etc.!...
Pluf!

O espírito da Terra revela o seu poder sob muitas formas.
A angústia nasce da percepção do inquietante.
No momento da morte, penetramos na substância da história.
O homem pode desafiar a morte, mas não a sua própria imagem.
Já não me rodeiam, no fumo e no bolor, senão esqueletos de animais e ossadas humanas.
Gostaria de permanecer no instante …
Vejo que não podemos saber nada.
Continuo a saber que o olho é um buraco deixado pelo nó de uma árvore. É frequente verem-se homens saudáveis evacuar excrementos abundantes sem que nenhuma necessidade o anuncie. O resto é tarefa do pessoal da limpeza. Vou descer aos infernos, onde cada tormento é aguilhão de volúpia…
Espere!... Espere!... Espere!...
Ouviu?!... Espere por mim!...

– E quem são estes? – perguntou a Rainha de Copas, apontando para os três jardineiros deitados à volta da roseira.
– Como hei-de eu saber? – disse Alice, espantada com a sua temeridade. – Não tenho nada com isso.
A Rainha ficou vermelha de raiva e, depois de lhe lançar um olhar fulminante, começou a gritar: – Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça!
– Que disparate! – protestou Alice, em voz alta e decidida, e a Rainha calou-se.
– Sabes jogar cróquete? – berrou a Rainha.
– Sim! – berrou Alice.
– Então anda daí! – ribombou a Rainha, e Alice juntou-se à procissão, interrogando-se sobre o que iria acontecer a seguir.
– Já para os vossos lugares! – trovejou a Rainha, e todos começaram a correr em todas as direcções, tropeçando uns nos outros. Porém, lá se instalaram passado algum tempo e o jogo começou.
Alice achou que nunca vira um campo de cróquete tão esquisito em toda a sua vida: era todo aos altos e baixos, as bolas de cróquete eram ouriços-cacheiros vivos, ostacos eram flamingos, e os soldados tinham de dobrar-se e ficar de gatas, para fazerem de balizas.
Todos os participantes jogavam ao mesmo tempo, sem esperar pela sua vez, sempre a discutir, e brigando por causa dos ouriços-cacheiros. Cedo a Rainha se pôs a tremer de raiva, e desatou a bater com os pés, berrando de minuto a minuto: – Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça!
Alice começou a sentir-se muito inquieta. Olhava em volta à procura de uma maneira de fugir, duvidando se conseguiria sair dali sem que a vissem, quando a Rainha desatou aos gritos, mesmo ao pé dela: – Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça! Cortem-lhe a cabeça!…

Tramas do Entardecer

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Rrrrreeec! Rrrrreeec! Rrrrreeec!

Rrrrreeec! Rrrrreeec! Rrrrreeec!

Nhuc!

Aaah! Aaah!

Nhuc!

Aaah! Aaah! Aaaaaaaaah!!!!

Vive!

Vive!

Vive!

Ritual no Tempo Transfigurado

Adolfo Luxúria Canibal / Miguel Pedro

Aniqui babá
Cavaquinho biribó
Da galinha p’ró peru
Passarinho totó
Aniqui bebé
Sacristão, sacristão
Cada bola mata um
A caminho do caixão
Um do li tá
Aniqui bobó
Pim, pim pam pum
A dançar o solidó
Quem se livra és tu
Biribiri biribó
A tocar a concertina
Na cabeça do sagui
Rei capitão soldado ladrão
Foi a filha da rainha
Pico-pico serenico
Vai ao mar buscar sardinha

Aniqui babá
Cavaquinho biribó
Da galinha p’ró peru
Passarinho totó
Aniqui bebé
Sacristão, sacristão
Cada bola mata um
A caminho do caixão
Um do li tá
Aniqui bobó
Pim, pim pam pum
A dançar o solidó
Quem se livra és tu
Biribiri biribó
A tocar a concertina
Na cabeça do sagui
Rei capitão soldado ladrão
Foi a filha da rainha
Pico-pico serenico
Vai ao mar buscar sardinha
Quem se esconde és tu
Um segredo colorido
Que está preso ao nariz
Da mulher do juiz
S. Manso te amanse
E o manso cordeiro
Pelo poder da Maria Pandilha
E de toda a sua família
Para que não possas comer
Nem beber, nem descansar
Para que não vejas Sol nem Lua
Em nome de Satanás
Barrabás e Caifás
Eu te enfeitiço

Com licença!...
Tenho, tenho algo a dizer-vos…
Tenho olhos novos, tudo me parece muito longe!
Não tem uma moeda? Alguém tem uma moeda? Oh!...
Eu vi a sua cara!...
Não compreende?
Sabe, eles também renegaram Jesus. E você não é Jesus!
Sobretudo, não me pergunte como…
Leva-me ao jogo?
Juntos podemos voar tão alto, juntos diremos adeus aos nossos amigos, juntos começaremos uma vida nova; juntos é o que iremos fazer!
Não é bonita a lua? A brilhar através das árvores?
Tenho um milhar de telefones que não tocam… Hei!
O telefone tocava numa cabine e quase me estatelei. Quando atendi e disse “Alô” um pé saiu pelo auscultador. Oh!...
O meu nome não quer dizer nada. E a minha idade ainda menos.
Tenho um milhar de telefones que não tocam… Hei! Como é que te sentes?!... Agora que tens de ganhar o pão com o suor do teu rosto não te sobra muito tempo para os problemas existenciais… Aaah!...
O meu nome não quer dizer nada. E a minha idade ainda menos.
Não tem uma moeda? Alguém tem uma moeda?
Eu nasci no deserto, cresci no antro dos leões!...
Não tem uma moeda? Alguém tem uma moeda?
Eu nasci no deserto, cresci no antro dos leões!...
Com licença!...
Com licença!...
Bebe o teu sangue até à borra, como um copo de vinho.
Bebe o teu sangue até à borra, como um copo de vinho.
Cruzei os braços e fui-me embora.
Cruzei os braços e fui-me embora.

rituais transfigurados

Ficha técnica

Gravado e misturado ao vivo em 5 de Julho de 2008 por Nuno Couto no Auditório Municipal – Vila do Conde e masterizado em Maio de 2009 por Miguel Pedro no My Own Studio – Braga. Produção de Mão Morta. Capa de Andreia Alves Mendes. Editado em Julho de 2009. Edição original Cobra.

  • Adolfo Luxúria Canibal – voz
  • Miguel Pedro – electrónica, bateria
  • António Rafael – teclas
  • Vasco Vaz – guitarra
  • Sapo – guitarra
  • Joana Longobardi – baixo

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